Comprei o ingresso para o segundo dia da "Van Gogh Experience", mas esqueci de ir... Não pensei duas vezes: comprei outro e fui. Como o evento está instalado no estacionamento térreo de um grande shopping, cheguei uma hora mais cedo para fazer umas comprinhas. Na hora marcada, às 11h, lá fui e minhas boas sacolas da Riachuelo conferir a imersão na obra do famoso pintor holandês.
De cara gostei da fila bem pequena e a pouca burocracia para entrar. Depois de percorrer um corredor com totens exibindo reproduções em miniaturas de outros impressionistas contemporâneos famosos como Van Gogh, cheguei ao grande salão onde acontece a projeção de recortes de telas do gênio dos girassóis.
Tudo muito lindo se você não for muito exigente com relação à qualidade das imagens um tanto desfocadas e projetadas na lona que serve de parede. O mega cubo forrado para a projeção conta com alguns poucos pontos de descanso caso você se enfade de ficar de pé ou andar em círculos para ver as mesmas imagens em pontos diferentes do salão.
Outra possibilidade de descanso é sentar no chão forrado, mas aí pode ter que disputar espaço com gente já vencida pelo cansaço, menino correndo, menino rodando atrás do rabo feito cachorro, menino dando pulitrica, chorando, gritando, levitando, manifestando línguas, etc, enquanto pais apáticos escolhem o melhor ângulo para a selfie de lei. Note que, apesar de ser uma imersão, ainda há acima da projeção um sinal visual de "faça silêncio". Esqueça. Todo mundo esqueceu também...
Voltando à minha saga, depois de 20 minutos de pé comecei a reparar nas pessoas mais preocupadas em filmar e fotografar talvez porque a "imersão" prometida trata-se mais um show de luzes e sons repetitivo e previsível do que um mergulho na atmosfera das obras de Van Gogh. Repito: é bonita, interessante, e pedagógica mas não vai além disso. Lembra Romero Britto como tema de festa de debutante ou chá revelação. Lembrei de um artista local que odeia quando dizem que seus trabalhos são bonitos. "Prefiro que seja incômodos", diz ele.
Há alguns anos participei de uma imersão de verdade sobre o silêncio em que os visitantes eram levados a atravessar salas e corredores com instalações que provocavam sensações diversas. Numa delas havia apenas um feixe fino de luz opaca vinda do alto do canto de uma parede. Angustiante, mas reflexivo.
Ao passo que andávamos pela instalação, a atmosfera mudava de opressora à acolhedora, de fria e pesada para aquecida e convidativa... Não havia imagens ou música. Todos em silêncio experimentamos um carrossel de emoções provocado pelas criações da artista plástica mineira Marilá Dardot. A vivência daquela arte nos tocou muito. Inesquecível.
Minhas visitas ao Museu do Piauí, no centro de Teresina, sempre me fazem imergir em outro tempo. A arquitetura do prédio centenário e o acervo contribuem para a captura do visitante e seu distanciamento do hoje. É uma sensação parecida à de entrar no Museu da Língua Portuguesa em São Paulo - guardada as devidas proporções - que usa da tecnologia para criar um contato quase físico com algo tão intangível como o idioma.
Minha experiência com Van Gogh em Teresina foi acompanhada também pelo questionamento do fato de uma capital, em pleno século 21, não ter um espaço público que possa abrigar exposições de grande porte, mesmo que sejam para consumo rápido como essa em cartaz no Shopping Rio Poty. A falta de museus modernos no Piauí é uma crítica antiga até mesmo de especialista de fora. E se eu disser que a capital do Piauí ja recebeu gravuras originais de Picasso ninguém acredita...
Depois de 30 minutos de powerpoint de Van Gogh, me dei por vencido. Desisti de esperar pela imagens que ainda não havia visto e minhas boas sacolas da Riachuelo pareciam ter dobrado de peso. Ao sair é claro que fui direto para a lojinha do evento instalada estrategicamente no final do corredor - bem Disney!
Paguei o estacionamento, entrei no carro e fui embora. Não parei de pensar que a Experiência Van Gogh é como uma propaganda de fast food: as imagens são meramente ilustrativas porque não correspondem mesmo à realidade. Será que extraviar o primeiro ingresso foi um aviso?
Olha só, você teve a fé de acreditar na imersão, pois ias amar esse contato com "o gênio dos girassois". Maasss... ficou a esperança de uma Teresina mais cultural. Ops!! Esperança e aquela lenda da caixa?
Uma vez passeando pelo RJ, fui ao Teatro Oi ( não sei se ainda existe e/ou trocou de nome) ver a peça Hair spray, conheci o diretor da peça e conversamos sobre essa carência de bons teatros no Piauí e em outras capitais também. Ele manifestou interesse em viajar com a peça, mas explicou que a falta de estrutura dos teatros o impedia, o que é lamentável.
Morri com o "depois de 30 min de Power point de Van Gogh". Kkkkk