O agente secreto que não deixa rastro

"O Agente Secreto", produção brasileira estrelada por Wagner Moura e que pode representar o Brasil na categoria de Filme Internacional e Melhor Ator no Oscar 2026, tem agradado mais ao júri de festivais internacionais do que ao público de casa. Na exibição que conferimos muitas pessoas deixaram a sala antes da metade do filme - o comportamento vai de encontro aos R$ 18 milhões de bilheteria...

Os motivos de certa má vontade, segundo os críticos do filme, vão desde o roteiro intrincado, ritmo lento e desfecho decepcionante. Com todo respeito aos divergentes e suas semioses, não foi este filme que este editor conferiu.

Na Recife final dos anos 1970, o enigmático Marcelo tem seus dias contados

Longe de ser "mais um filme brasileiro ambientado no período da Ditadura", o filme escrito e dirigido por Kleber Mendonça Filho é um thriller político instigante que mantém qualquer espectador atento no desenrolar da trama cheia de segredos guardados e mistérios desvendados.

Outro grande trunfo da produção está na produção e direção de arte para ambientar o cotidiano do discreto Marcelo (Wagner Moura) que chega na Recife de 1977 em busca de abrigo e proteção. Pelas próximas 2 horas e meia de projeção, somos apresentados a uma série de personagens pitorescos, algo caricatos e muito diferentes entre si; muitos deles compartilham um só objetivo: (sobre)viver.

Um deles é Dona Sebastiana (Tânia Maria), 77 anos, dona da pensão que funciona como uma "embaixada" para perseguidos políticos em seus países e estados por denunciarem e enfrentarem a corrupção e violência praticadas pelos governos locais.

A coragem de Sebastiana só perde para sua maneira espirituosa de confortar seus "inquilinos".

É nesse arremedo de cotidiano comum que o homem chamado Marcelo tenta se encaixar buscando trabalho e cautela para reencontrar a família - o filho pequeno, sogro e sogra, até ter sua cabeça colocada a prêmio por um dos grandes operadores da corrupção governamental sistêmica. Viúvo, Marcelo precisou se afastar do filho por precaução.

SEBASTIANA: embaixadora dos refugiados políticos

Divido em três partes, "O Agente Secreto" é um filme denso, mas não pesado, com momentos de respiro bem colocados - muitos com humor trash deslavado. Essa estratégia do roteiro mantém o foco do público sobre a figura enigmática e comedida do protagonista e se questione sobre quem é Marcelo e, afinal de contas, qual o motivo de sua presença entre refugiados políticos.

No decorrer da trama, as camadas vão sendo suspensas e entra em cena a ação física cheia de plot twists dignos de clássicos de espionagem. Equívocos levam a ações impensadas e mortes violentas depois de perseguições. A sede de revelações só aumenta no espectador que é presenteado com um balde de água fria que o prepara para um final completamente fora da curva baseado no fato de que memória, acima de tudo, é afeto. Agentes secretos também amam e têm coração...

5/5