Faz algum tempo que recebi, no meio da madrugada, a mensagem de uma pessoa muito próxima me alertando sobre um carregamento de arroz envenenado que estaria sendo vendido por essas bandas.
Essa mesma pessoa já foi vítima de golpe pela internet, mas, sempre que pode, afirma que é uma "pessoa muito bem informada". Assiste telejornais e programas policiais diariamente e adora uma resenha das tragédias diárias...
Não é muito afeita à tecnologia e redes sociais, mas se mostra bastante politizada e defensora ferrenha de suas convicções partidárias. Sim! Ela usa Whatsapp e, sempre que pode, lá está ela em uma manifestação em prol daquilo que acredita.
Tem formação superior, é viajada e eloquente - principalmente em discussões acaloradas em que defende com unhas e dentes seus pontos de vista. Uma delas é que se deve desconfiar de tudo e de todos porque o mundo é um lugar perigoso e ruim. Em suma, minha personagem é uma cidadã alerta que defende aquilo que considera como "verdade".
Mas o que leva uma pessoa aparentemente consciente de seu papel societário acreditar em boatos infundados que se alastram como praga pela internet? A resposta é simples: a vontade de acreditar.
No meio acadêmico essa propensão em crer naquilo que reforça nossas crenças chama-se de viés de confirmação. Quem não conhece alguém que morre de medo de médico porque acreditam que eles é que causam doenças. Imagine se num check-up, o doutor descobre algo por menor que seja? Bingo! "Eu estava certo!"

Se contra fatos não há argumentos, contra crenças arraigadas não existem esclarecimentos que possam diminuir efeitos que boatos ou mentiras bem contadas possam causar - acrescente aí os filtros, edição, efeitos, inteligência artificial e toda sorte de recursos que a internet oferece para criação de posts...
As fake news afetam ricos e pobres, doutores e iletrados sem distinção porque mobilizam crenças pessoais que estão na base da nossa individualidade e até mesmo personalidade.
Não à toa a polêmica do momento no Brasil é mais um exemplo de que, mesmo havendo incessante esclarecimento vindo de fontes oficiais e legítimas, uma imensa maioria prefere acreditar naquilo que casa com a convicção (não tão errada assim) de que o Estado sempre quer tira algo de nós sem devolução à altura.
Fake News, dessa forma, funcionam como placebo para as multidões: a fé cura, mas , nesse caso, acredita-se mais no aspecto "divino" do que na ciência contida no remédio...
Combater boatos e mentiras virtuais passa necessariamente pelo desenvolvimento de senso crítico e leitura de mundo, mas num país em que tudo se constrói a partir do teto, é impossível que a casa não caia.
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